leitura apenas por estética?
aparentemente o pinterest também está arruinando a literatura
esta publicação faz parte da newsletter plot persuits, onde eu compartilhos minhas leituras e as minhas crises existenciais, toda terça-feira, às 8h.
nos últimos anos, a leitura deixou de ser aquela atividade introspectiva e, muitas vezes, solitária para se transformar num verdadeiro fenômeno social — altamente visual e, vamos combinar, um tanto performático (autocrítica). o que antes era um momento de silêncio e reflexão pessoal agora é exibido em feeds impecavelmente organizados, cheios de estantes perfeitas e influenciadores literários que transformam livros em acessórios de estilo.
hoje, plataformas como instagram, tiktok, pinterest e youtube estão abarrotadas de estantes minuciosamente arrumadas, fotos perfeitamente enquadradas, e influenciadores posando com suas leituras do momento. e claro, não faltam aquelas listas intermináveis de livros que, supostamente, você precisa ler (mais uma vez, autocrítica).
mas o que será que está por trás desse boom visual em torno da leitura? será que ainda estamos conectados ao conteúdo ou nos preocupamos mais com a aparência?
o que antes era um ato privado e até um pouco recluso — a leitura — virou parte de um espetáculo visual que é exibido para o mundo. hoje, o que conta não é apenas o que você está lendo, mas como você é percebido enquanto faz isso. na era das redes sociais, as coisas funcionam assim: cada detalhe visual está a serviço de uma identidade cuidadosamente construída.
essa tal “estética da leitura” que tomou conta das plataformas digitais não é apenas uma moda passageira. é um reflexo de como a cultura digital valoriza, cada vez mais, a curadoria visual e a construção de identidades online.
o que antes era um hobby silencioso e até solitário se transformou em um atestado de status social e capital cultural. e vamos ser sinceros, quem não quer um pedaço dessa fama literária, mesmo que, às vezes, o conteúdo dos livros acabe ficando em segundo plano?
porque, afinal de contas, no universo das redes sociais, a imagem é tudo, né?
dark academia, light academia e além
pra entender o fenômeno da “leitura por estética” nas redes sociais, a gente precisa dar uma boa olhada nas subculturas visuais que estão moldando o jeito que muita gente se apresenta enquanto leitor. movimentos como o dark academia e light academia são exemplos perfeitos de como a estética em torno dos livros foi além do conteúdo e ganhou vida própria.
e, claro, não é só sobre o que as pessoas estão lendo, mas sobre como elas se mostram enquanto leem.
o dark academia, por exemplo, é uma estética que idolatra a intelectualidade, o estudo clássico e aquele mistério sombrio que a gente ama. inspirado por temas góticos, arquitetura antiga e obras literárias meio pesadas, como o morro dos ventos uivantes da emily brontë ou a história secreta da donna tartt, esse estilo virou o sinônimo de uma leitura cult e super sofisticada. nas redes, o dark academia aparece em fotos de bibliotecas escuras, roupas vintage e citações filosóficas que fazem qualquer um querer parecer um estudante perdido num campus de outra era.
por outro lado, temos o light academia, que é como o primo otimista e ensolarado do dark academia. aqui, o foco é o conhecimento e a cultura, mas com um tom mais suave e positivo. pensa em campos abertos, luz natural e aquela vibe de crescimento pessoal. as leituras são de autores que trazem uma energia mais leve e esperançosa, como jane austen ou e.m. forster. esse é o tipo de estética que faz você querer pegar um livro e se sentar em um jardim florido, só pra absorver aquelas boas vibrações.
outras estéticas que estão fazendo sucesso incluem o cottagecore, que mistura a ideia de uma vida bucólica e tranquila com leituras de clássicos da literatura naturalista, e o fairycore, com foco na fantasia e em livros que evocam mundos mágicos e etéreos. cada uma dessas estéticas traz uma perspectiva diferente sobre como a leitura é apresentada e consumida, reforçando a ideia de que, hoje, ler não é só sobre o que está nas páginas, mas sobre como você constrói uma identidade visual em torno disso.
essas tendências mostram bem como a leitura se tornou mais performática, especialmente nas redes sociais.
em vez de ser apenas uma atividade, a leitura agora também virou uma forma de se conectar com subculturas específicas, cada uma com sua estética própria. é uma interseção entre literatura e identidade pessoal que, vamos ser honestos, às vezes coloca o conteúdo dos livros em segundo plano.
a influência das celebridades e o surgimento da estética da leitura
nos últimos anos, as celebridades colocaram a leitura sob os holofotes das redes sociais de uma maneira inesperada. de repente, ser visto com um livro na mão virou um sinônimo de inteligência, sofisticação e, claro, coolness.
e, convenhamos, a gente adora seguir as tendências que essas figuras públicas impõem, né?
o caso da reese witherspoon é um ótimo exemplo de como uma celebridade pode mudar o rumo de um livro. seu clube do livro, o reese’s book club, não só promove discussões literárias como transforma obras em best-sellers quase instantâneos. títulos que ela recomenda explodem nas vendas, e editoras sabem muito bem disso. por trás dessa estratégia, existe um claro uso de capital cultural: ser visto lendo — ou melhor, sendo alguém que lê — passou a ser mais do que um hábito pessoal; virou um símbolo de status.
outro exemplo? emma watson.
além de ser uma atriz extremamente popular, ela também é uma ativista ferrenha, e seu clube do livro our shared shelf focado em obras feministas, trouxe uma onda de interesse por livros com temática de empoderamento e igualdade de gênero. a leitura, nesse caso, se transformou em uma forma de militância, algo para além do ato individual e mais próximo de uma ferramenta social.
essa mudança no consumo de livros nas redes sociais, incentivada pelas celebridades, não é só sobre o que você lê, mas sobre como isso reflete na sua imagem pública. criar um clube de leitura ou compartilhar as leituras pessoais se tornou uma forma de aumentar o capital cultural e de se alinhar a causas mais amplas, como o feminismo, a justiça social ou até a saúde mental — algo que pessoas como oprah winfrey e sarah jessica parker também fazem muito bem.
e como tudo que vira tendência, as celebridades ajudaram a moldar o fenômeno da “estética da leitura”, onde o livro deixou de ser apenas uma fonte de conhecimento para se tornar parte de um espetáculo visual. quem nunca viu aquelas fotos perfeitas nas redes sociais, com uma xícara de café ao lado de um livro e uma legenda super reflexiva?
isso não é só coincidência.
as celebridades e influenciadores ditam o que é cool, e o público, claro, segue a trilha. e vamos combinar, se eles estão lendo, você não quer ficar de fora, né?
o impacto na indústria editorial
o fenômeno das redes sociais, principalmente plataformas como booktok e bookstagram, causou um impacto gigantesco na indústria editorial, mudando completamente como os livros são promovidos e consumidos.
editoras e livrarias, espertas que só, perceberam o potencial dessas recomendações virais e começaram a adaptar suas estratégias de marketing pra aproveitar o poder dos influenciadores literários. isso trouxe uma série de mudanças — tanto nas vendas quanto no comportamento dos leitores.
revivendo livros antigos e impulsionando novos
uma das transformações mais curiosas foi a capacidade dessas plataformas de trazer de volta livros que estavam meio apagados. sabe aqueles títulos que pareciam esquecidos? eles voltaram com tudo graças à recomendação dos influenciadores. exemplos? a canção de aquiles, da madeline miller, e uma pequena vida, de hanya yanagihara, tiveram uma explosão de vendas anos após suas publicações, tudo por causa do entusiasmo dos criadores de conteúdo que espalharam essas histórias para milhões de seguidores.
ciclo de vendas a mil por hora
com a demanda gerada pelas redes sociais, editoras tiveram que repensar como lançam e promovem novos títulos. esqueça aquelas longas campanhas de marketing pré-lançamento; agora tudo acontece bem mais rápido. editoras estão ajustando as tiragens com base no desempenho de um livro nas redes, muitas vezes reimprimindo edições ou adicionando novas pra dar conta da procura quase imediata provocada por um simples post viral. e sim, livrarias como a barnes & noble estão até criando seções inteiras dedicadas ao booktok, o que gerou um boom nas vendas.
diversidade literária e novas vozes
além de vender mais livros, as redes sociais estão ajudando a diversificar o mercado editorial. influenciadores literários estão usando suas plataformas pra dar visibilidade a autores e histórias que, em muitos casos, ficariam à margem no mercado literário tradicional. isso inclui escritores de minorias étnicas, autores lgbtqia+ e narrativas que fogem do comum. booktok e bookstagram, de fato, ampliaram a representatividade dentro do mundo literário, colocando em evidência obras que editoras maiores muitas vezes deixariam passar batido.
mudança no comportamento dos leitores
o impacto das redes também mexeu com o jeito que as pessoas compram livros. hoje, os leitores não estão só atrás de uma boa história; eles querem participar de uma comunidade literária online. plataformas como tiktok e instagram fazem da leitura um ato social, onde a estética, o pertencimento a um grupo e a influência dos outros contam bastante na hora de escolher o que ler.
pressão nos autores e nas editoras
apesar dos benefícios, as recomendações virais trazem alguns desafios. editoras têm que lidar com a volatilidade das tendências e com a pressão de manter uma oferta constante de novos conteúdos. os autores, por sua vez, podem sentir a necessidade de ajustar seus estilos de escrita ou promover seus livros de maneira mais performática, pra agradar essa audiência digital. e, vamos combinar, a proliferação de “resenhas rápidas” e book hauls às vezes acaba simplificando a experiência literária, focando mais na estética do que no conteúdo.
o impacto da cultura visual e performática da leitura nas redes sociais trouxe tanto oportunidades quanto desafios pra indústria editorial. editoras estão correndo pra se ajustar à nova realidade, tentando aproveitar o entusiasmo dos leitores e a viralidade dos conteúdos, enquanto tentam manter a qualidade e a profundidade literária em um ambiente que não para de acelerar.
a misoginia nas críticas à comunidade leitora
é impossível falar de bookstagram e booktok sem reconhecer o preconceito velado que ronda essas comunidades. sim, elas são dominadas por mulheres jovens, e o sucesso dessas plataformas tem incomodado muita gente.
a leitura, que tradicionalmente foi vista como algo sério e intelectual, virou alvo de críticas assim que as mulheres começaram a moldar esse espaço com sua própria estética e estilo de consumo. e, claro, com isso vieram as acusações de superficialidade. mas a gente sabe que isso não é apenas uma crítica literária inocente — é, muitas vezes, uma manifestação de misoginia disfarçada.
vamos falar sério: quando as mulheres tomam a frente de uma comunidade, o que elas valorizam rapidamente é rotulado como “menor”, “superficial” ou “não sério o suficiente”. ao longo da história, o que as mulheres amam — seja romances de banca, diários pessoais ou, hoje, suas resenhas e vídeos de booktok — sempre foi tratado como algo trivial. esses gostos são descartados como “fúteis” justamente porque são predominantemente femininos.
e se isso não é um reflexo claro de misoginia, eu não sei o que é.
a coisa fica ainda mais séria quando a gente pensa em como o mercado literário trata o que é considerado “feminino”. gêneros como young adult, romances de época ou de ficção romântica, por exemplo, são sempre vistos como “menos importantes” em comparação com outras categorias literárias, geralmente associadas ao gosto masculino ou ao que a crítica considera “alta literatura”. livros escritos por mulheres, para mulheres, são automaticamente descartados por uma parte do público que insiste em desvalorizar aquilo que elas amam. e isso não é coincidência. é a mesma lógica que sempre marginalizou os hobbies femininos, seja nas artes, na música ou, agora, na literatura.
e aí a crítica começa a se mascarar de “preocupação com a qualidade”.
há quem diga que essas plataformas focam mais na estética do que no conteúdo, que as resenhas são superficiais ou que as pessoas estão mais preocupadas em postar fotos de suas estantes do que em ler de verdade. mas por que será que esse tipo de julgamento não acontece com as comunidades predominantemente masculinas? quando um homem fala sobre o que leu, ele raramente tem que lidar com esse tipo de crítica — porque sua leitura é automaticamente validada como “séria”. mas quando uma mulher posta uma resenha no booktok, ela precisa se justificar de que está, sim, engajada no conteúdo do livro, e não apenas exibindo um objeto de decoração.
também é importante destacar que muitas dessas críticas estão carregadas de um elitismo intelectual (sim, vamos falar muito sobre isso nessa newsletter).
a leitura sempre foi vista como um espaço para poucos, e agora que as mulheres estão popularizando certos tipos de livros, trazendo diversidade e representatividade, essa visão está sendo questionada. as plataformas como booktok e bookstagram abriram as portas para que mais pessoas, de diferentes contextos, se conectassem com a literatura. mas, ao fazer isso, elas também desafiaram o que sempre foi considerado o “padrão” do que merece ser lido.
no fim das contas, essa misoginia velada reflete o desconforto de ver uma comunidade literária dominada por mulheres prosperando. o que essas plataformas oferecem é um espaço seguro para que as mulheres compartilhem suas experiências de leitura, discutam sobre os livros que amam e, sim, façam isso de maneira estética e visual. mas isso não diminui a profundidade da experiência — só a enriquece com uma camada que, historicamente, foi negada a elas.
equilibrando estética e substância
vamos ser sinceros: a estética tem seu valor, principalmente quando falamos de livros nas redes sociais. mas o que não podemos esquecer é que a leitura, no fundo, é uma experiência íntima e transformadora — algo que vai muito além das fotos bonitinhas e das estantes organizadas.
então, como a gente encontra o equilíbrio entre a obsessão pela estética e a profundidade da literatura?
primeiro, a gente precisa entender que essas duas coisas — estética e substância — não são inimigas. ao contrário, elas podem andar juntas. claro que postar uma foto bem elaborada com um livro e uma xícara de café em uma mesa de madeira desgastada faz parte da vibe, mas isso não significa que a pessoa não está envolvida com o conteúdo do livro. a estética é uma maneira de tornar a leitura mais acessível, mais atrativa e, sim, mais social.
afinal, nas redes, o visual é a linguagem principal.
mas o perigo aparece quando a estética começa a ofuscar a substância. um dos grandes desafios é não se perder nessa necessidade de validação visual e manter o foco naquilo que faz a literatura ser tão especial: as histórias, as ideias, as emoções que cada página pode trazer. e não podemos negar que, às vezes, a pressão por criar conteúdo estético para as redes sociais pode desviar um pouco desse propósito original. é aí que entra a crítica de que algumas comunidades estão mais preocupadas em mostrar o setup do que em se aprofundar nos textos.
por outro lado, essas plataformas criam um espaço único de compartilhamento e discussão que, sem a estética envolvida, talvez nem existisse. o visual atrai, mas o conteúdo sustenta. uma foto bonita pode chamar a atenção de um novo leitor para um livro que ele nunca teria considerado. booktok e bookstagram estão conectando milhões de pessoas com obras que nunca estariam em seus radares, e isso é inegavelmente poderoso.
a estética acaba sendo a porta de entrada para que novos leitores descubram mundos inteiros de histórias, autores e temas.
e é isso que precisamos celebrar. encontrar o equilíbrio entre estética e substância não significa abandonar o visual, mas, sim, reconhecer o valor daquilo que estamos consumindo. no final, a leitura é uma experiência pessoal, e o que importa é como ela ressoa com cada leitor. pode ser por meio de uma resenha profunda ou de uma imagem que captura a essência do livro. a verdadeira chave é lembrar que, por trás das fotos e vídeos, existem páginas que ainda têm o poder de transformar quem as lê.
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🏷 nota de rodapé
você leu até o fim! ❤ eu sei que essa newsletter é meio inconstante, mas sabe o que não é? as minhas redes sociais. então não deixa de me acompanhar em outros canais para não perder os meus surtos literários!
sabe o que esse texto me lembrou? daquela vez que a Jout Jout leu um livro infantil completo num vídeo e o livro EXPLODIU de vendas. eu acho esse um exemplo claro da influência e da nossa conexão enquanto seres humanos. a gente quer pertencer e se alguém que a gente admira diz que algo é legal (mesmo que seja a leitura) então deve ser legal *mesmo* e a gente precisa fazer parte disso. no fim, a gente é influenciar o tempo inteiro, quer esteja conectado e tenha milhões de seguidores, quer não. e eu sinto que o mercado de livros se aproveita disso também como uma parte da misoginia que você citou - é um mercado que se aproveita muito dos gostos femininos e explora isso à extensão, né?